Sacada. Música tocando na sala logo após a porta de vidro. Último maço de cigarros, um cigarro aceso, o qual ela segurava em sua mão esquerda. Algumas latas de cerveja. O garoto entra.
— Você não devia fumar.
— Sempre imaginei alguém aparecendo e me dizendo isso.
— Ah, sério?
— Agora se você continuar o diálogo como eu sempre imaginei eu posso ter um treco. Por que eu não deveria fumar?
— Você é muito bonita para fumar.
— Então é, você está lendo minha mente.
Ele sorriu, deu um passo e tirou o cigarro da mão dela, quando ela estava prestes a colocá-lo na boca mais uma vez.
— Tá, você tem lido o meu blog ou coisa do tipo?
— Você tem um blog mesmo? Eu leria.
— Não, não leria.
— Não leria?
— Leria, mas não me contaria. Você usaria como uma arma secreta ou qualquer merda dessas.
Ao passo que ele tomava mais um gole, a música mudou. Ela tomou mais um gole também e fechou os olhos por um segundo.
— Essa música me lembra uma pessoa. Na verdade, a banda lembra.
— Alguém que você sente falta?
— Não exatamente.
— Alguém que você gostaria de sentir falta?
Ela encarou-o, embasbacada.
— Você é bom.
— Valeu.

Ele fez uma pausa, observando algo no azul céu da noite.
— Então, por que estamos aqui amargos assim?
— Não estou amarga, e você só está... aqui.
— A cerveja está meio amarga, e nós estamos tomando, o que nos faz amargos.
— Isso não faz sentido.
— A vida também não, mas você questiona a vida?
— Você se considera tão importante quanto a vida?
— Não sei, mas se eu pudesse ser a sua vida eu ficaria feliz.
— Então você está aqui para flertar? Legal.
— Você realmente acha isso legal?
— Talvez. Se você não estivesse bêbado seria mais legal.
— Não estou bêbado ainda, amor. Mas sim, eu concordo.
— Você flerta com cantadas melhores quando está bêbado?
— Está ansiosa para descobrir?
— Estou ansiosa por mais um cigarro.
— E eu estou ansioso para ler esse seu blog.
— Com que objetivo?
— Talvez eu ache algo que seja de fato útil na questão de flertar com você.
— Acho que você já tem uma arma secreta e está fingindo isso tudo.
— E o que te leva a essa conclusão?
— O fato de que é isso que eu quereria que você fizesse, ou, melhor, gostaria que você fizesse se fosse uma das minhas criações nesse blog que eu posso ou não posso ter e eu não deveria te contar mais sobre.
— Eu pareço com alguma das suas criações?
— Não sei dizer, elas basicamente existem por si mesmas.
— Então poderia ser que você baseou alguma delas em mim?
— Ah, eu não faria isso.
— E por que não?
Ela tirou o último maço de cigarros do bolso, observou-o, e deixou-o na sacada enquanto bebia o que havia sobrado na lata de cerveja, parando exatamente na frente dele antes de se direcionar à porta.
— Porque estou ansiosa para descobrir que tipo de personagem você é, ou poderia ser, ainda mais ansiosa do que estava pelos cigarros.
— Posso acabar usando esse seu interesse contra você.
— Arma secreta, rapaz.
"Arma secreta", ela disse para si mesma enquanto saía, sentindo os olhos dele grudados em suas costas. Ou grudados no céu. Ela não sabia dizer, porque assim como os personagens dela, ele existia por si mesmo.