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11 agosto 2021
O Vazio Aqui Dentro

— Você também sente um tipo de vazio por dentro? Eu sinto bem aqui logo abaixo do meu esterno. Você tem isso também?

Ele estava em pé atrás dela e gesticulou em direção ao centro de seu peito, mas ela não tirou os olhos das telas.

— De vez em quando, sim. Mas eu sinto o meu mais acima do esterno. Nunca defini de fato a posição dele, para ser sincera. — ela disse, movendo os olhos de uma tela para a outra, a luz do computador refletindo pequenos quadrados nos olhos dela.

— Talvez todo mundo sinta isso, hoje em dia. Você acha que é um buraco de verdade?

— Anatomicamente falando, não. Mas acho que sempre foi assim. Não só hoje em dia.

— Hum.

Ela pressionou algumas teclas e moveu o mouse pela tela para posicionar uma imagem, aumentando e diminuindo o zoom rapidamente, fazendo com que a tela piscasse por alguns segundos. Ele se inclinou para frente sobre o ombro dela, apoiando-se com uma mão na mesa, apertando os olhos para tentar entender o que ela estava procurando ao passo que ela aumentava o zoom mais uma vez e começava a cuidadosamente preencher uma seção específica da imagem. Era como assistir uma experiente artista cinzelando os menores detalhes de uma escultura.

— Isso tá ficando muito maneiro.

— Obrigada.

— Como você aprendeu tudo isso?

— Por conta, a maior parte. E por maior parte eu quero dizer absolutamente tudo, já que ninguém nunca me ensinou de fato, eu sempre fui atrás de aprendizados e conhecimentos por conta.

— Sim, mas, como? Onde você encontrou a motivação ou a necessidade de aprender esse... "ofício"?

Ela diminuiu o zoom mais uma vez, digitou um comando para salvar seu trabalho e jogou as mãos para o alto num alongamento antes de inclinar-se para trás em sua cadeira e virar-se na direção dele.

— Talvez eu tenha feito para tentar preencher o meu vazio. Sabe, esse que sentimos perto do osso esterno.

Jonatan Pie @ Unsplash

Ele virou o corpo para longe dela, inclinando-se de costas para a mesa, braços cruzados, encarando alguma coisa no ar entre eles, pensativo.

— Mas você ainda sente, não é? De vez em quando, como disse. Será que é porque por mais que você seja incrível no que você faz, não é uma coisa pela qual as pessoas te elogiariam, sob circunstâncias comuns e casuais? E então, o vazio persiste?

Ela levantou os joelhos e abraçou-os contra o peito, movendo seus ombros para cima e para baixo em outro tipo de alongamento.

— Não é tão profundo. Não é como se eu estivesse tomando medidas colossais para preencher essa sensação de vazio, às vezes eu acho que ela, na verdade, me impulsiona adiante. E realmente não me importo com o que as pessoas comuns e casuais esperam das coisas que eu faço. Você também não, acredito eu, sobre a "coisa" que fazemos. E também, não deveria o vazio ser preenchido com algo que importa para nós e somente para nós, ao invés de para outras pessoas?

— Acho que isso depende de que tipo de pessoa nós somos. Imagino que os comuns e casuais se sintam muito cheios.

— Se sentem, de fato? Ou eles simplesmente não estão cientes de seu vazio?

— Estarmos cientes de nossos próprios vazios é um sinal de que somos pessoas melhores?

— Acho que sim. Talvez sempre estará lá, então não faz mal reconhecê-lo.

— Mas, então, qual o sentido? Não seria melhor simplesmente não estar ciente dele? Se nunca seremos capazes de preenchê-lo?

— Talvez não haja sentido. — ela disse, girando com a cadeira antes de se levantar e se dirigir à porta aberta para a sacada, do lado oposto da sala.

— Estamos apenas vagando sem direção pela existência? — ele perguntou, seguindo-a até a porta, com as mãos nos bolsos. A suave brisa da noite adentrava a sala e eles ficaram em silêncio por um momento, olhando para o escuro céu estrelado assomando sobre as árvores altas do parque do outro lado da rua.

— Sim. Mas que puta existência extraordinária é esta, você não acha?

Eles olharam um para o outro pelos cantos de seus olhos e sorriram antes de virarem-se para a porta da frente e ver Stacy os encarando, segurando uma caixa de pizza em uma mão e uma sacola plástica — com uma garrafa de Coca-Cola, copos vermelhos descartáveis e um pacote de guardanapos — na outra.

— Como diabos vocês foram parar nessa estranha conversa sobre os mecanismos da existência? — Stacy perguntou.

— Você demorou com a pizza.

— Um estômago vazio é combustível para psicanálise. Você lembrou de pedir pepperoni extra?


Acho que essa aqui é uma mistura de duas histórias que imaginei mas não consegui com que fossem pra frente por conta. Não que eu tenha feito grandes progressos, tudo que tenho são ideias flutuando e uma vontade estranha de ter uma personagem chamada Stacy. Parece ser um nome tão bom, consigo visualizar outros personagens chamando por ela e tudo, sabe. "Ei, Stace! Stacy!" (com um sotaque britânico bem exagerado, é claro)

Você consegue ouvir também?

Sinceramente,
Júlia P. V. Souza

Trilha Sonora